Futebol careta x Futebol rock'n'roll

por Julio

Aff... Definitivamente, as coisas não vão bem nesse mundão. Com vocês o confronto do futebol careta (de retranca e bons modos) vs. o futebol rock'n'roll (ofensivo e de espetáculo). Ouve essa:

“EI, JUIZ! VAI SE CONVERTER”

Hoje o amigo Antonio Figueiredo (Figa) enviou uma notícia do portal UOL sobre torcidas organizadas evangélicas. É isso mesmo que você acabou de ler: TORCIDAS ORGANIZADAS EVANGÉLICAS.

Segunda a matéria [1], que tem vídeo e entrevistas, tudo começou no Paraná, em 2005, com a “Torcida Evangélica do Coritiba”, e desde então a idéia vem se espalhando pelo país. No Rio de Janeiro, dois grandes clubes já possuem as suas: A Fogospel, do Botaofogo; e a Flagospel, do Flamengo.

Os três mandamentos das torcidas são: não consumir bebidas alcoólicas, não brigar, não xingar. Vejam isso: nem xingar o juiz. Silva, o presidente da Flagospel é quem explica:

"Você realmente não escuta palavrão porque essa é uma das poucas regras que nós colocamos. Não brigamos, não bebemos e não falamos palavrão. É claro que existem pessoas que não são evangélicas e se juntam a nós por conta do clima mais tranquilo, elas acabam cedendo ao ímpeto de xingar um determinado jogador, por exemplo. Mas para quem é efetivamente integrante da torcida evangélica, isso é mais do que uma regra, é uma questão de bom exemplo".

O presidente da Fogospel completa (veja o vídeo abaixo, que faz parte da matéria):

"Não se trata de uma questão de norma comportamental, pois as pessoas que optam por assistir aos jogos com a Fogospel já se enquadram em um determinado padrão. Muitos pais levam os filhos justamente em função disso. Mas se a pessoa ainda tem esse hábito, mesmo sendo evangélica, já muda de comportamento três ou quatro jogos depois. Nunca precisei chamar atenção de alguém por esse motivo"

Pois bem, pois agora além da consagração da retranca no futebol, com Corinthians e Chelsea campeões continentais, também os “bons modos” vão imperar nas arquibancadas?

Bom, a bebida já é proibida nos estádios, mas até o palavrão? O palavrão, aliás, é um dos principais recursos do torcedor, o momento de extravasar, do bom humor até. Lembro que no ano passado, na partida entre São Paulo e Vasco pelo Brasileirão, no Morumbi, estava com o Figa e o Léo na arquibancada. Na ocasião, o São Paulo perdeu por 2 a 0. No final do jogo xingamos muito, quase todo o time e até a comissão técnica. Quando todos já tinham descido para o vestiário, xingamos quem estava no gramado. Tinha um rapaz enrolando aquela espécie de tapete com publicidade, que fica atrás dos gols. O Figa soltou: “ei, enrola esse tapete e enfia no teu cu”. As gargalhadas foram imediatas, e logo outros torcedores também xingaram o pobre rapaz trabalhador, aos risos. Óbvio que não estávamos culpando o rapaz, óbvio que não tínhamos raiva dele, e pela distância ele nem estava ouvindo os xingamentos, tratava-se apenas de extravasar. Enfim, o São Paulo perdeu, mas saímos do estádio gargalhando.

Enfim, brincadeiras a parte, não sou contra as torcidas evangélicas. Cada um torce como lhe convém. Mas acho muito estranho – e até engraçado – ver alguém no estádio sem soltar palavrões. Mesmo porque o ambiente é do palavrão. O gênio das crônicas de futebol, Nélson Rodrigues, já dizia que:

“o sujeito vai para a arquibancada, que além de ser a pátria do palavrão é uma pátria da piada, uma pátria das graças que vêm das profundezas de nosso querido povo. A pessoa fica criando, inventando até palavrões”[2].

Entendam: não é o palavrão e nem mesmo a bebida que estragam o futebol. Amigos, como nós aqui do blog, bebemos juntos, fazemos piadas com os times dos nossos amigos, xingamos os nossos times e os juízes (sempre prejudicando todos) e convivemos em paz. Até mesmo com quem não é amigo, mas encontramos em um bar, assistindo a uma partida. As gozações aparecem, as piadas surgem. O que estraga o futebol é o desrespeito ao próximo, e isso pode acontecer com quem está bêbado ou sóbrio, falando palavrão ou não, torcedor adversário ou do mesmo time, religioso ou não (sobre violência entre torcidas, já publiquei matéria ha alguns meses, intitulada "como explicar a irracionalidade?" - para ler clique AQUI).

O futebol é um esporte de massa, em Copa do Mundo todas as torcidas se juntam. Por um clube, como diz a letra do Samuel Porfírio, “crentes e macumbeiros” se abraçam, ateus fazem promessas. E antigamente, até mesmo nos estádios os adversários assistiam às partidas juntos. 

Aliás, essa é uma boa sugestão. As torcidas organizadas evangélicas de Flamengo e Botafogo deveriam assistir ao clássico juntas na arquibancada. Isso sim seria algo interessante de se ver - e agregando também quem fala palavrão (rs).

Então, o que falta não são bons modos, mas respeito. O mesmo tipo de respeito que deve haver em qualquer ambiente. Afinal, para além das paixões clubísticas: É SÓ FUTEBOL, IRMÃO. É dessa maneira que esse circo todo deve ser visto.

DIA MUNDIAL DO ROCK

Por fim, para exorcizar a caretice da retranca e da falta de palavrões, volto ao meu Tricolor, que teve a primeira torcida organizada rockeira de que se tem notícia no país: a Metal Tricolor, formada por amigos rockeiros que se reuniam para ouvir rock’n’roll, beber e ver os jogos do Tricolor.

E para comemorar a data, nada melhor que a música que embala a entrada do São Paulo F.C. em campo, todos os jogos, a pedido do M1TO: Hells Bells, do AC/DC. 

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[1] ANDRADE, Hanrrickson. Evangélicos formam torcidas organizadas e são proibidos de xingar nos estádios. UOL Rio de Janeiro. 13/07/2012. Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/07/13/nao-beber-nao-brigar-e-nao-xingar-sao-os-tres-mandamentos-das-torcidas-organizadas-evangelicas-de-futebol.htm

[2] RODRIGUES, Nélson. À sombra das chuteiras imortais: crônicas de futebol. (Ruy Castro, org.). São Paulo, Companhia das Letras, 1993, p.17